A presente análise jurídica tem por objeto a ação de improbidade administrativa, examinando três aspectos fundamentais à luz da legislação vigente e da jurisprudência consolidada dos tribunais superiores: (i) à impossibilidade de seu ajuizamento com finalidade meramente declaratória em desfavor de colaborador premiado; (ii) à conversão da ação de improbidade em ação civil pública; e (iii) ao prazo prescricional aplicável a magistrados estaduais, à luz da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
No tocante ao primeiro ponto, é necessário afirmar que a colaboração premiada, prevista nos artigos 4º a 7º da Lei n. 12.850/2013, está fundada nos princípios da boa-fé objetiva, da proteção à confiança legítima e da segurança jurídica. O acordo firmado entre o colaborador e o Estado é expressão de um negócio jurídico processual especial, cujos efeitos devem ser preservados. A tentativa de ajuizamento de ação de improbidade com escopo exclusivamente declaratório da prática de ato ímprobo, sem pleito de imposição de sanções adicionais àquelas pactuadas no acordo de colaboração premiada, viola os aludidos princípios e compromete a credibilidade do instituto. Tal medida gera incertezas jurídicas e desestimula a adesão de futuros colaboradores, esvaziando os objetivos consensuais que justificam a própria colaboração.
Quanto ao item (ii), a Lei n. 8.429/1992, com redação dada pela Lei n. 14.230/2021, prevê expressamente, em seu art. 17, §§ 16 e 17, a possibilidade de conversão da ação de improbidade administrativa em ação civil pública. Todavia, a interpretação sistemática dos dispositivos demonstra que tal conversão deve ocorrer exclusivamente no primeiro grau de jurisdição e antes da prolação da sentença. A menção ao “magistrado” e a previsão do agravo de instrumento como recurso cabível reforçam a competência do juízo de primeiro grau. A conversão, por implicar modificação da causa de pedir e dos pedidos, enseja eventual aditamento da inicial e abertura de nova fase instrutória, devendo ser adotada de modo a garantir o contraditório, a ampla defesa e a estabilidade da lide. Sua realização em sede recursal implicaria retrocesso processual e descompasso com os princípios da celeridade e economia processual.
Por fim, no que se refere ao prazo prescricional da ação de improbidade em face de magistrados, mesmo estaduais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que, diante do silêncio da Lei Orgânica da Magistratura (LOMAN) quanto ao prazo prescricional para imposição de penalidades, aplica-se subsidiariamente a Lei n. 8.112/1990, conforme exigência constitucional de tratamento isonômico à magistratura nacional. Assim, adota-se o prazo prescricional correspondente ao tipo penal imputado, nos termos do art. 142, §2º, da Lei n. 8.112/1990. Para a infração correspondente ao crime de concussão, por exemplo, aplica-se o prazo de 12 anos, contado da ciência do fato pela autoridade competente para instauração do processo administrativo disciplinar, conforme precedente do STJ (RMS n. 44.218/RS).
Conclui-se, portanto, que: (i) não se admite a utilização da ação de improbidade com finalidade meramente declaratória contra colaborador premiado, sob pena de violação à segurança jurídica; (ii) a conversão da ação de improbidade deve ocorrer antes da sentença e no primeiro grau de jurisdição; e (iii) aplica-se, subsidiariamente, a Lei n. 8.112/1990 para fins de prescrição da ação de improbidade contra magistrados estaduais, por força da isonomia constitucional entre os ramos do Judiciário.
RESUMO:
(i) A tentativa de ajuizar ação de improbidade com o objetivo exclusivo de declarar a existência de ato ímprobo praticado pelo beneficiário do acordo de colaboração premiada, sem imposição de sanções além daquelas previamente ajustadas, compromete a segurança jurídica, a previsibilidade do sistema e a eficiência das investigações, além de desestimular potenciais delatores, de maneira que o ajuizamento de ação declaratória nesses moldes não é compatível com a finalidade normativa da Lei n. 8.429/1992.
(ii) A conversão de ação de improbidade administrativa em ação civil pública, prevista no art. 17, § 16, da Lei n. 8.429/1992 (com a redação atual), deve ocorrer no primeiro grau de jurisdição, antes da sentença, conforme interpretação teleológica e sistemática do dispositivo, com competência atribuída ao magistrado de primeira instância e decisão de conversão sujeita ao recurso de agravo de instrumento, conforme previsto no § 17 do mesmo artigo.
(iii) O prazo prescricional da ação de improbidade, em caso de atos correspondentes a crimes cometidos por magistrados estaduais, é regulado pela Lei n. 8.112/1990, ante o silêncio da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN); sendo que o termo inicial desse prazo é a ciência do ato pela autoridade com atribuição para instaurar o processo administrativo disciplinar.