Para melhor compreender o debate, é necessário que se faça uma digressão histórica:
A Lei 8.213, de 24/07/1991, estabeleceu que o cálculo do salário-de-benefício deveria observar a média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição, até o máximo de 36, apurados em período não superior a 48 meses.
A Lei 9.876, de 26/11/99, modificou a forma do cálculo para os filiados a partir de sua vigência, determinando que o salário-de-benefício deveria observar a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário.
Mas e quem se filiou à previdência antes da Lei 9.876/99 e ainda não tinha cumprido os requisitos para aposentadoria? Para isso foi criada uma regra de transição:
No cálculo da aposentadoria do segurado filiado à Previdência até 25/11/99 e que ainda não tinha cumprido as exigências para concessão de benefícios do RGPS, será considerada a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, correspondentes a, no mínimo, 80% de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994.
O que os contribuintes incluídos na regra de transição queriam?
Utilizar as contribuições anteriores a julho de 1994, sob o fundamento de que a regra nova, aplicável aos segurados a partir de 26/11/99, permitiria a utilização de todo o período contributivo sem qualquer limitação.
O que decidiu o STF?
Prevaleceu a tese de que a regra de transição é norma de observância cogente pelos demais órgãos do Poder Judiciário e pela Administração, de modo que não cabe ao segurado, que se enquadre na regra de transição, optar pela norma que lhe for mais favorável.
OPINIÃO:
Salvo melhor juízo, acredito que a decisão do STF foi acertada.
Isso porque, tanto para os que se filiaram antes quanto para os que se filiaram depois de 26/11/99, o salário-de-benefício será calculado de acordo com os salários-de-contribuição a partir de julho de 1994. Seja porque a norma assim determina (filiados antes), seja porque não contribuíram em período anterior a julho de 1994 (filiados depois). Não há quebra da isonomia aqui.
Aliás, nem os segurados que se enquadram na regra antiga (redação original da Lei 8.213/91) tinham o direito de considerar todo o período contributivo, pois o cálculo se limitava aos últimos 48 meses.
Assim, caso a Revisão da Vida Toda tivesse prevalecido, teríamos o seguinte cenário:
– Filiados até 26/11/99 e que tenham cumprido os requisitos para se aposentar até essa data: utilizariam a média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição, até o máximo de 36, apurados em período não superior a 48 meses;
– Filiados após 26/11/99: utilizariam a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário;
– Filiados até 26/11/99 e que não tenham cumprido os requisitos para aposentadoria: utilizariam a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, correspondentes a, no mínimo, 80% de todo o período contributivo, inclusive anteriores a julho de 1994.
Portanto, a Revisão da Vida Toda ensejaria a criação de um grupo sui generis de segurado, não previsto em lei, estabelecendo normas mais favoráveis que não foram previstas para nenhum outro segurado, afetando inclusive o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema previdenciário.
Apenas para ilustrar a situação atípica que a Revisão da Vida Toda poderia ocasionar, a regra ATUAL, fruto da reforma da previdência de 2019, também não prevê a possibilidade de utilização de todo o período contributivo, definindo que o cálculo deve observar 100% do período contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde o início da contribuição, se posterior àquela competência (art. 26 da EC 103/2019).