O STJ, ao julgar os Recursos Especiais n.ºs 1.914.902/SP, 1.944.757/SP e 1.961.835/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema 1.134), fixou a seguinte tese:
“Diante do disposto no art. 130, parágrafo único, do Código Tributário Nacional, é inválida a previsão em edital de leilão atribuindo responsabilidade ao arrematante pelos débitos tributários que já incidiam sobre o imóvel na data de sua alienação.”
Tal entendimento pacifica controvérsia jurisprudencial acerca da responsabilidade do arrematante por débitos tributários preexistentes à arrematação judicial, especialmente quando há previsão expressa no edital de leilão transferindo tal ônus ao adquirente.
Interpretação do art. 130 do CTN
O art. 130 do CTN dispõe que os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis sub-rogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação.
Entretanto, o parágrafo único do mesmo artigo estabelece exceção para os casos de arrematação em hasta pública, determinando que, nessa hipótese, a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço, e não na pessoa do arrematante.
Dessa forma, na arrematação judicial, o crédito tributário se sub-roga no valor pago pelo arrematante, e não o vincula pessoalmente, caracterizando-se como aquisição originária da propriedade, livre de ônus anteriores.
Princípio da legalidade tributária e sujeição passiva
O princípio da legalidade tributária, previsto no art. 150, I, da Constituição Federal, impõe que somente a lei pode instituir ou majorar tributos, bem como definir o sujeito passivo da obrigação tributária.
Nesse sentido, a sujeição passiva tributária somente pode ser atribuída por lei complementar, conforme o art. 146, III, da Constituição Federal, e o art. 121, parágrafo único, II, do CTN.
Assim, cláusulas editalícias que imputam ao arrematante responsabilidade por débitos tributários anteriores à arrematação carecem de respaldo legal, sendo, portanto, inválidas.
Inoponibilidade de cláusulas editalícias contrárias à lei
O art. 886, VI, do CPC determina que o edital de leilão deve conter a indicação dos ônus que recaiam sobre o bem.
Contudo, essa exigência não autoriza a transferência de responsabilidade tributária ao arrematante, especialmente quando tal disposição contraria norma legal expressa, como o art. 130, parágrafo único, do CTN.
Portanto, a mera ciência ou anuência do arrematante quanto à existência de débitos tributários não tem o condão, por si só, de afastar a aplicação da norma legal que o exime de tal responsabilidade.
Modulação dos efeitos da decisão
Considerando a alteração de entendimento jurisprudencial e visando à segurança jurídica, o STJ modulou os efeitos da decisão, estabelecendo que a tese fixada no Tema 1.134 aplica-se:
- Aos editais de leilão publicados após a data de publicação da ata de julgamento do recurso repetitivo;
- Aos processos judiciais e administrativos pendentes de apreciação até a referida data, aos quais a tese se aplica de imediato.
Conclusão
Assim, a tese firmada pelo STJ reforça a observância do princípio da legalidade tributária e a necessidade de que a sujeição passiva seja definida exclusivamente por lei.
Ao declarar inválida a cláusula editalícia que transfere ao arrematante a responsabilidade por débitos tributários anteriores à arrematação judicial, o STJ assegura a aquisição originária da propriedade, livre de ônus pretéritos, conferindo maior segurança jurídica aos participantes de leilões judiciais e fomentando a efetividade das execuções judiciais.