A definição da natureza jurídica do pedido de esclarecimento ou de ajustes, previsto no artigo 357, §1º, do CPC, é essencial para o estabelecimento de diversos parâmetros processuais. A relevância do tema decorre da necessidade de estabelecer a correta interpretação desse instituto, que se insere no modelo cooperativo de processo adotado pelo CPC/2015, permitindo que as partes participem ativamente do saneamento do feito.
O estudo aborda quatro questões centrais: (i) se o pedido possui natureza jurídica de recurso, considerando o princípio da taxatividade recursal e a ausência de previsão legal expressa; (ii) se ele tem efeito interruptivo para a interposição de outros recursos, examinando sua possível equiparação aos embargos de declaração e as implicações para o prazo recursal; (iii) a distinção entre o pedido de esclarecimento ou ajustes e o pedido de reconsideração, destacando suas diferenças conceituais e processuais, bem como os reflexos dessa diferenciação na contagem dos prazos recursais e na estabilidade das decisões judiciais; e (iv) qual o termo a quo para interposição do agravo de instrumento quando o pedido é formulado e quando não é formulado, explorando as consequências processuais e os riscos de preclusão para as partes.
Além dessas questões, serão analisadas a função do pedido de esclarecimento dentro do procedimento de saneamento, sua relação com o contraditório substancial e a estabilidade da decisão saneadora. A jurisprudência do STJ sobre o tema será examinada de forma detalhada, a fim de demonstrar como se deve aplicar a norma e quais os impactos práticos dessa interpretação para a condução do processo civil.
Natureza jurídica do pedido de esclarecimento ou ajustes
O pedido previsto no art. 357, §1º, do CPC não possui natureza recursal, pois não se enquadra na definição legal de recurso, que é o meio processual destinado à impugnação de decisões judiciais, conforme disposto nos arts. 994 a 1.044 do CPC. Segundo o princípio da taxatividade recursal, apenas os instrumentos previstos expressamente na legislação podem ser considerados recursos, não sendo possível a ampliação desse rol por analogia.
A jurisprudência do STJ tem reforçado que o pedido de esclarecimento ou ajustes visa aprimorar a decisão saneadora, permitindo que as partes contribuam para a correta delimitação das questões processuais relevantes, sem que isso represente impugnação formal à decisão. Trata-se, portanto, de um mecanismo que fortalece o contraditório substancial e a cooperação processual, princípios norteadores do CPC. Essa característica diferencia substancialmente esse pedido dos embargos de declaração, que possuem a função específica de sanar omissões, contradições e obscuridades em decisões judiciais e, por força do art. 1.026 do CPC, possuem efeito interruptivo de prazos recursais.
Além disso, o pedido de esclarecimento ou ajustes não desafia decisão que resolva mérito ou questão incidental de forma definitiva, mas apenas propicia ajustes e clarificações no contexto do saneamento do processo, reforçando sua natureza procedimental e não recursal. Essa distinção é essencial para evitar a utilização inadequada desse mecanismo como meio de protelação processual e garantir sua correta aplicação dentro da estrutura do processo civil brasileiro.
O pedido de esclarecimento ou ajustes e o pedido de reconsideração
É essencial distinguir o pedido de esclarecimento ou ajustes do pedido de reconsideração, pois ambos possuem fundamentos jurídicos e efeitos processuais distintos. O pedido de reconsideração, ainda que admitido na prática forense, não tem previsão expressa no CPC/2015 e consiste em um mero requerimento ao magistrado para que reveja sua decisão, sem que haja previsão legal de obrigatoriedade de apreciação. Trata-se de um instrumento informal, sem efeitos suspensivos ou interruptivos de prazos recursais, e seu eventual acolhimento decorre unicamente da liberalidade do julgador.
Já o pedido de esclarecimento ou ajustes previsto no art. 357, §1º, do CPC possui um regime jurídico próprio, inserindo-se no modelo cooperativo do processo civil. Ele confere às partes um direito subjetivo à manifestação sobre a decisão de saneamento, visando garantir a clareza e a efetividade do contraditório e da ampla defesa. Seu objetivo não é provocar uma reanálise do mérito da decisão, mas sim possibilitar que as partes contribuam para sua adequada formulação antes de sua estabilização.
O STJ, ao diferenciar esses institutos, tem consolidado o entendimento de que o pedido do art. 357, §1º, é uma etapa procedimental vinculada ao saneamento do processo, enquanto o pedido de reconsideração é uma solicitação genérica sem efeitos jurídicos próprios. No julgamento do REsp 1.703.571/DF, a Corte reafirmou que a formulação do pedido de esclarecimento impede a estabilização imediata da decisão saneadora, mas não suspende ou interrompe prazos recursais, diferentemente dos embargos de declaração, que possuem previsão expressa de efeito interruptivo (art. 1.026 do CPC).
Além disso, enquanto o pedido de reconsideração pode ser apresentado em qualquer fase do processo, o pedido de esclarecimento do art. 357 deve ser formulado dentro do prazo específico de 5 (cinco) dias, sob pena de estabilização da decisão saneadora. Essa característica reforça sua inserção no modelo cooperativo e sua distinção dos mecanismos tradicionais de impugnação de decisões judiciais.
Portanto, a distinção entre os institutos é fundamental para evitar equívocos processuais e garantir a correta aplicação das normas do CPC. O pedido de esclarecimento ou ajustes não se confunde com um recurso, tampouco com um pedido de reconsideração, possuindo natureza jurídica própria voltada à organização eficiente do processo.
Efeito interruptivo para outros recursos
O pedido de esclarecimento ou ajustes não possui efeito interruptivo do prazo recursal, uma vez que a interrupção do prazo para interposição de recursos é prerrogativa exclusiva dos embargos de declaração (art. 1.026 do CPC) e dos embargos de divergência (art. 1.044, §1º, do CPC). A doutrina e a jurisprudência do STJ consolidaram o entendimento de que o pedido previsto no art. 357, §1º, do CPC não se equipara a essas modalidades recursais, pois não tem o objetivo de corrigir vícios de obscuridade, contradição ou omissão na decisão judicial, mas apenas permitir que as partes contribuam para o aprimoramento da decisão saneadora antes de sua estabilização.
O STJ, no julgamento do REsp 1.703.571/DF, reforçou que a extensão do efeito interruptivo a esse pedido configuraria a criação indevida de nova hipótese de suspensão de prazo recursal, sem amparo legal expresso. Além disso, permitir tal interpretação poderia gerar insegurança jurídica, pois abriria espaço para manobras protelatórias e prejudicaria a celeridade processual, princípios fundamentais do direito processual civil. Assim, o pedido de esclarecimento ou ajustes deve ser compreendido como um mecanismo de aprimoramento da decisão saneadora, sem qualquer interferência na contagem dos prazos recursais.
Termo inicial do prazo para interposição do agravo de instrumento
O termo inicial para interposição do agravo de instrumento contra decisão saneadora está diretamente relacionado à estabilidade da decisão, conforme preconizado pelo STJ:
- Caso a parte formule pedido de esclarecimento ou ajuste no prazo de cinco dias, o prazo para interposição do agravo de instrumento tem início com a publicação da decisão que responde ao pedido;
- Se a parte não apresenta o pedido no prazo, a decisão saneadora torna-se estável após o transcurso do quinquídio legal, sendo este o termo inicial para a contagem do prazo recursal.
Portanto, apesar de o pedido de esclarecimento não ter como efeito processual a interrupção do prazo para interposição do agravo de instrumento, o dies a quo desse recurso ocorrerá apenas com a publicação da decisão que responder ao pedido de ajustes ou, caso não haja esse requerimento, com o transcurso do prazo de 5 (cinco dias) legalmente estabelecido.
Essa orientação busca evitar insegurança jurídica e a possibilidade de preclusão do direito de recorrer. A jurisprudência tem reforçado que o objetivo do dispositivo é permitir maior cooperação das partes na definição do saneamento, e não servir como mecanismo de suspensão ou interrupção do prazo recursal.
Portanto, diante de tudo quanto foi exposto é possível concluir que o pedido de esclarecimento ou de ajustes, previsto no art. 357, §1º, do CPC/2015, não possui natureza recursal e, por conseguinte, não interrompe o prazo para interposição de agravo de instrumento, muito menos se confunde com o pedido de reconsideração. O prazo para interposição do agravo inicia-se com a publicação da decisão que resolve o pedido de esclarecimento ou, na sua ausência, com o decurso do prazo de cinco dias.
Dessa forma, o entendimento exarado pelo STJ no REsp 1.703.571/DF, a respeito da aplicabilidade do art. 357, §1º, do CPC, concretiza a harmonização do princípio da estabilidade da decisão saneadora com a previsibilidade e segurança jurídica no cálculo dos prazos recursais.