Contexto: No RE 635659, o Supremo Tribunal Federal julgou se o porte de maconha para consumo pessoal, previsto no artigo 28 da Lei 11.343/2006, é crime ou infração administrativa.
Impactos e justificativas: Segundo o STF, a criminalização do porte de maconha para uso pessoal viola direitos fundamentais, como a privacidade e a liberdade individual. A decisão também levou em consideração estudos que mostram que a criminalização não reduz o consumo de drogas e pode, ao contrário, aumentar a violência associada ao tráfico.
Critério de 40 gramas: O STF fixou um critério para diferenciar o usuário de maconha do traficante, estabelecendo que a posse de até 40 gramas de maconha caracteriza consumo pessoal, enquanto quantidades superiores a esse limite podem indicar prática do tráfico. Este critério visa fornecer uma orientação clara para as instâncias inferiores e evitar interpretações arbitrárias.
Mas o critério é relativo: Contudo, essa determinação não exclui a possibilidade de caracterização do tráfico de drogas em situações em que sejam encontrados indícios suficientes de atividade ilícita, mesmo que a quantidade apreendida seja inferior ao limite estabelecido.
Caracterização do tráfico de drogas com quantidade inferior a 40 gramas de maconha
Apesar de a quantidade encontrada ser inferior a 40 gramas de maconha, é possível a caracterização do tráfico se houver elementos indicativos do crime, tais como:
- Dinheiro em espécie: A apreensão de quantias significativas em dinheiro pode indicar o comércio ilegal de drogas.
- Balança de precisão: A presença de equipamentos destinados à pesagem precisa de substâncias sugere a prática de fracionamento e venda.
- Anotações de contabilidade: Registros de transações relacionadas ao tráfico reforçam a tese de comércio ilegal.
- Embalagens fracionadas: Diversas embalagens, prontas para venda, são indícios de tráfico.
Portanto, o critério quantitativo de 40 gramas não é absoluto. A interpretação da lei deve ser sistêmica e considerar o conjunto de circunstâncias e provas materiais que possam indicar a intenção de tráfico.
Aplicação prática: Na prática, os agentes de segurança pública e o Poder Judiciário devem analisar cada caso de forma individualizada, levando em conta não apenas a gramatura da maconha encontrada, mas também as circunstâncias, o contexto da apreensão e o conjunto de evidências, podendo levar em consideração elementos indiciários para caracterizar a prática do tráfico de drogas.
Liberação dos presos: Não haverá liberação automática dos presos cuja privação de liberdade decorra da apreensão de maconha em quantidades inferiores a 40 gramas. Isso porque o critério não é absoluto, devendo ser consideradas as condições do caso concreto.
Conclusão: A decisão do STF, ao estabelecer o critério de 40 gramas de maconha para diferenciar usuário de traficante, visa proporcionar maior objetividade e segurança jurídica.
Contudo, a caracterização do tráfico de drogas não se restringe a esse parâmetro quantitativo. A existência de elementos adicionais que indiquem a prática do tráfico permite a caracterização do delito, mesmo que a quantidade de droga apreendida seja inferior ao limite estipulado. E o contrário também é verdade: pode não ser caracterizado o tráfico de drogas se, apesar de a quantidade ser superior a 40 gramas de maconha, não houver elementos que indiquem a prática do ilícito penal.
O princípio da razoabilidade e a análise detalhada das circunstâncias do caso concreto são fundamentais para a correta aplicação da lei, nos termos do entendimento do STF.
O julgamento inédito do STF representa uma mudança significativa na abordagem do porte de maconha no Brasil, passando a tratá-lo de forma menos punitiva e mais focada na saúde pública, de modo que o critério de 40 gramas como limite para consumo pessoal busca trazer mais objetividade e segurança jurídica.