pós a entrada em vigor da Lei nº 14.112/2020 e esgotado o período de blindagem (stay period) estabelecido no §4º do art. 6º da Lei nº 11.101/2005 (Lei de Recuperação Judicial e Falência) e não havendo deliberação da Assembleia Geral de Credores quanto à aprovação do plano de recuperação judicial, a execução de sentença trabalhista, cujo crédito é de natureza concursal, deve retomar seu curso no Juízo Trabalhista ou se a competência do Juízo Recuperacional permanece?
Inicialmente, é preciso entender o que se trata o período de blindagem (stay period).
O período de blindagem, ou stay period, é um instituto previsto na Lei nº 11.101/2005 durante o qual ficam suspensas todas as execuções e cobranças judiciais contra a empresa em recuperação judicial. Esse período tem como objetivo proporcionar um ambiente estável e controlado para que a empresa possa negociar com seus credores e apresentar um plano de recuperação, sem sofrer os efeitos imediatos de execuções ou penhoras de bens.
Conforme o art. 6º, §4º, da Lei nº 11.101/2005, o stay period dura 180 dias, podendo ser prorrogado, uma única vez, por igual período, desde que haja justificativa. Durante esse tempo, os credores não podem tomar medidas individuais para satisfazer seus créditos, devendo aguardar a aprovação do plano de recuperação na Assembleia Geral de Credores. Se o plano for aprovado e homologado pelo juiz, o crédito será pago conforme as condições estabelecidas no plano. Caso o prazo do stay period seja encerrado sem a aprovação do plano ou prorrogação devidamente justificada, os credores podem retomar suas execuções individuais.
A Lei nº 14.112/2020 prevê que, após o término do período de blindagem, o prolongamento do stay period só poderá ocorrer caso os credores decidam apresentar um plano de recuperação alternativo dentro do prazo de 30 dias. Esse entendimento foi confirmado pela jurisprudência, conforme decisão no REsp nº 1.991.103-MT, que também permite uma possível prorrogação negociada.
O inciso I do § 4º-A do art. 6º da LRF estabelece claramente que, se esgotado o prazo inicial de blindagem sem a deliberação do plano de recuperação judicial pelos credores e sem que seja apresentado um plano alternativo no prazo de 30 dias, as suspensões das execuções de créditos submetidos à recuperação e os prazos prescricionais cessam, e as medidas constritivas podem ser retomadas.
Diante da clareza dos dispositivos legais (art. 6º, §§ 4º e 4º-A, inciso I), não é possível manter a suspensão das execuções individuais após o fim do stay period, caso os credores não aprovem um plano de recuperação ou apresentem plano alternativo. Assim, a competência do Juízo Recuperacional para a suspensão de execuções não persiste sem a anuência expressa dos credores.
Portanto, esgotado o prazo de blindagem e não havendo decisão do Juízo da recuperação judicial prorrogando ou determinando a continuidade de seus efeitos (decisão essa que pode ser questionada por meio dos recursos cabíveis), as execuções individuais, inclusive aquelas envolvendo créditos concursais, podem seguir seu curso no Juízo competente, sem a subsistência da competência do Juízo Recuperacional.
No entanto, caso a Assembleia de Credores aprove o plano de recuperação judicial e este seja homologado pelo Juízo, a concessão da recuperação judicial implica, automaticamente, na novação dos créditos concursais. Isso resulta na extinção das execuções em andamento, desde que o crédito não tenha sido quitado, e o pagamento passa a observar os termos do plano aprovado. Ademais, caso haja posterior decretação de falência, isso pode também impactar as execuções individuais que estejam pendentes.
Em resumo, uma vez encerrado o stay period e não havendo decisão judicial determinando sua prorrogação ou continuidade, a execução dos créditos trabalhistas concursais pode prosseguir normalmente no Juízo Trabalhista, com a adoção das medidas constritivas necessárias.
TESE: Ultrapassado o período de blindagem (Stay Period) e inexistindo decisão do Juízo recuperacional determinando sua prorrogação ou a subsistência de seus efeitos, a execução do crédito trabalhista concursal pode prosseguir normalmente perante o Juízo trabalhista.
CC 199.496-CE, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 11/9/2024.