A cumulação de fundamentação em uma única ação civil pública, com base simultaneamente na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992) e na Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), configuraria violação ao princípio do non bis in idem, ao resultar em dupla persecução e punição pelos mesmos fatos?
NÃO.
Para o STJ, é juridicamente viável que uma mesma conduta seja examinada sob a ótica da improbidade administrativa e da responsabilidade da pessoa jurídica por atos lesivos à administração pública, desde que, ao final, não sejam aplicadas sanções de mesma natureza pelos mesmos fatos. A coexistência dos dois regimes jurídicos decorre da autonomia de suas normas e da possibilidade de sanções distintas para sujeitos diversos.
A recente alteração do art. 3º, § 2º, da Lei nº 8.429/1992 esclarece que as sanções dessa lei não incidirão sobre a pessoa jurídica caso o ato de improbidade seja igualmente enquadrado como ato lesivo nos termos da Lei nº 12.846/2013. Tal previsão visa evitar a duplicidade de sanções de mesma natureza, mas não impede a tramitação simultânea de ações fundamentadas em ambas as leis.
Dessa forma, a compatibilidade entre os dois diplomas legais está assegurada, desde que a aplicação das penalidades respeite os limites normativos, impedindo que um mesmo ilícito resulte em punições idênticas. Assim, se ao final do processo forem impostas sanções previstas na Lei Anticorrupção à pessoa jurídica, ficará prejudicada a aplicação das penalidades estabelecidas na Lei de Improbidade Administrativa para os mesmos fatos.
Além disso, o art. 30, I, da Lei nº 12.846/2013 reforça que os mecanismos sancionatórios previstos na Lei Anticorrupção são complementares e não excluem aqueles estabelecidos em outras legislações, como a Lei de Improbidade Administrativa. Essa diretriz evidencia que ambas as normas podem coexistir no ordenamento jurídico, sem que isso implique violação a garantias fundamentais, desde que observada a vedação à cumulação de sanções de idêntica natureza sobre um mesmo sujeito e fato.
RESUMO: A utilização conjunta das Leis n. 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa) e n. 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) para fundamentar uma mesma ação civil não configura, por si só, violação ao princípio do non bis in idem.
REsp 2.107.398-RJ, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 18/2/2025, DJEN 24/2/2025.